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terça-feira, agosto 30, 2016

Momento TrumTIP  

Se ainda precisava de ser notado, é mais fácil do que parece ceder ao irracional, ao medo e à frustração destilada em raiva que se acumula em nós.

A França disse que vai propor não a suspensão mas o fim da negociação do TTIP. Na realidade, ouvindo com atenção, o que propõem é a suspensão (prontos para recomeçar sobre bases mais seguras, mais protectoras das excepções europeio-francesas). Mas não interessa, foi o suficiente para disparar um sentimento de alegria, um bem-feito, ora toma lá, embrulha.

Contra quem? Contra eles, os que mandam, os que podem, os que são maus.

Mas a coisa é assim tão má? Provavelmente, não demasiado.

Quer dizer, um bocado, é; ou seria; ou será. Como poderia ser de outra forma, nos dias que correm?

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domingo, agosto 28, 2016

Sinais 

Estamos a ficar velhotes.
Já temos de nos perguntar "Então, como vais, o que se tem passado, não conheço o teu mais novo, quando é que nos encontramos outra vez"?

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quarta-feira, agosto 24, 2016

Quarto da Rosa 

No quarto da Rosa estava o grande quadro de ardósia. Tinha uma certa centralidade, aposto que estava à janela, era a televisão daquela divisão e daquele tempo. Ali, a minha Avó escrevia os números de telefone importantes, antes de a sua profusão tornar o exercício cada vez mais impossível. Havia também datas e um ou outro rabisco que eu pedia para apagar quando queria desenhar na parte de baixo, a seguir à tal agenda de contactos.
No quarto havia uma caixa de costura, grená, rectangular, ela própria costurada em ziguezague ao longo da borda. Era mais uma das muitas coisas da casa para as quais eu olhava, às vezes abria, contentado em remexê-las apenas superficialmente, um misto de receio de não saber voltar a repor e cansaço antecipado de uma tarefa que não valia a pena começar.
Mas havia um sítio onde eu brincava diariamente. Era uma arca de madeira, sem o menor ornamento, pousada no chão debaixo da janela, encostada de um lado à máquina de costura antiga e, do outro, a uma mesa circular, recoberta por um enorme pano até ao pé, que tinha quase do mesmo diâmetro. Eu reclinava-me no chão, encostado ao sacos de roupa que se escondiam debaixo da mesa, e ficava com os olhos exactamente ao nível do tampo da arca. E esta transformava-se assim na melhor rua do mundo, por onde eu fazia correr os meus carrinhos e lhes testava as suspensões e derrapagens vezes sem conta.
Entre a mesa e o armário,escondia-se o saco vermelho escuro, da forma do do Pai Natal, onde a minha Avó guardava a sarapilheira do tapete de arraiolos.
O armário era de madeira escura, ocupava toda a parede, e tanto podia ser um cofre-forte como um portal para outra dimensão, tão poucas as vezes que o vi aberto, e então apenas para revelar, invariavelmente e como tudo na casa, toneladas de casacos, roupa e sacos vários, que tentavam por momentos escapar por entre lufadas de naftalina.
A partir de certa altura, colocaram na parede uma pequena moldura dourada a fingir de antiga. Nunca teve nada que não a fotografia com que veio da loja, um barco no meio de um lago, tudo em fortes tons de verde. Fazia de bom companheiro a um, quando não mais, calendário ilustrado.

Finalmente, havia uma pequena cama de rede articulada que se dobrava completamente, fazendo-se móvel introspecto durante o dia. Simbolizava à vez a leveza da passagem daquele pequeno corpo pela vida e a dureza do acolhimento. Era nesse aspecto mínima e simples a pegada que deixava, e deixavam que deixasse, a ponto de não ter nunca tido, em 60 anos, um local normal para dormir.


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Cozinha 2 

Seguia-se o frigorífico, que conheceu várias evoluções, sempre em crescendo, com as versões anteriores encontrando o caminho do barraco - mas já lá vamos.
Do outro lado, continuava o degrau de mármore, que tinha subido para se tornar uma pia de cor creme. Do seu ralo, a Rosa tirava os restos de comida depois de lavar a louça, água quente e sabão azul, com os dedos esqueléticos e nodosos.
Chegávamos depois ao esquentador, às máquina de lavar louça e roupa e às gaiolas dos pássaros, antes de rodarmos 90º para chegar à porta do quintal. Era de metal pintado de verde escuro, uma chapa fina na metade de baixo e uma rede de grandes argolas tangentes em cima, defendendo um vidro fosco que não deixava realmente ver nada. O mecanismo da fechadura era um acrescento quadrado em cima do qual havia um aro por onde a minha Avó fazia passar, a modos de tranca, uma pequena barra castanha de metal.
Ao lado encostava-se uma caixa branca que me parece chegou a esconder um tanque, e seguiam-se depois as portas da casa de banho e do quarto da Rosa.



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domingo, agosto 21, 2016

Contador a gás 

A cozinha tinha um velho contador de gás, vermelho, com dois tubos que o fixavam à parede, ao lado da porta, perto do fogão e impossivelmente alto. Era ali que a minha Avó às vezes fixava a corda onde estendia a roupa para secar no Inverno. Deslizava pela longura da cozinha até chegar algures à parede onde estava a porta que abria para o quintal.
A minha mais antiga memória é a de correr por entre os lençóis estendidos na cozinha, ziguezagueando rente ao chão, a encher-me com riso e com o cheiro de roupa lavada.
Por debaixo do contador, à mesma distância que os sapatos estão do chapéu de um gigante, repousava sempre um pequeno banco, de pernas muito curtas, quadrado, e revestido com um plástico quase do mesmo tom de encarnado.
Ao lado, o degrau de mármore onde estava o fogão, primeiro um branco, com bonitos botões salientes a controlar o silvo que antecipava a explosão do acender e o ai da Rosa que queimava os dedos a tentar poupar fósforos como instigava a Avó, depois um outro, maior e moderno, sem outra distinção.
À frente, a arca, debaixo do que deviam ter sido os armários originais dos anos 40, com um pequeno rectângulo de rede ao fundo e ao meio de cada portinha, para arejamento. A arca, como tudo na cozinha, como tudo na casa - como um pouco tudo na vida da minha Avó, foi com o tempo quase desaparecendo no acumular de coisas sem conta, que a cobriam, escondiam e tornavam um suplício para revelar.
À arca seguia-se um armário artesanal, sem gosto, gavetas amontoadas por detrás de uma porta, e das quais se parecia apenas usar uma, sempre a mesma, para tirar os talheres, que tinham um forte odor de metal. Eram os garfos e facas de todos os dias mas apanhavam o cheiro, se não mesmo o polimento, dos de cerimónia, tudo feito à mão, à antiga, pela Rosa, como os bolinhos de bacalhau, uma colher sobre uma outra, a dançar uma e outra vez para dar forma à pasta que o diabo queria que se amassasse.


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quinta-feira, agosto 18, 2016

17 km 


8º lugar no Stupava trophy, por entre os 12 homens de 40 a 49 anos.

1h45m49s

E o grande detalhe: 370 m de diferença de altitude. Que é como quem diz: foi quase sempre a subir.

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quarta-feira, agosto 17, 2016

Sanitas, tanto tempo passado 

Anos e anos e anos mais tarde, depois de ter retido na memória desde criança apenas a estranheza instigadora da cena da mesa rodeada de sanitas, descubro qual era o filme.

E que outro alguém achou também interessante aquele pedaço.

https://en.wikipedia.org/wiki/The_Phantom_of_Liberty
(Bunuel)
https://www.youtube.com/watch?v=PTUvB1ygPbw
(Slavoj Zizek, minute 1.56)

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Possible title 

Interesting conversations that we will never have.

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